Meu diário de bordo

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

Sem limites

 O infinito abre os braços e me chama

Para o abraço da liberdade.

Ou seria o abraço da eternidade?

Lambo o chão que se gasta sob meus pés

Com os olhos injetados de alegria

Eis o sem fim aos meus pés!

 

Não deixo saudades à mostra.

Não freio os instintos,

Deixo que escorreguem rumo ao nada.

Abraço a imensidão solta do mundo

Nesse pedaço de chão.

 

Beijo o asfalto quente,

Sinto o gosto doce da solidão

No frio aceno do vento.

Nada me falta e

Nada me resta,

Só o infinito é o limite da liberdade!

 


Açucarada

 De amor quero cochichar no seu ouvido,

Fazer cócegas na sua imaginação,

De A a Z uma centena de palavras que faz sentido

Com cada uma delas fazer uma confissão.


Chegue perto, feche os olhos e ouça

O meu gemido de satisfação;

Pari poesias plenas de gozos inteiros

Só para cochichar em segredo

Meu amor desatinado por você.


Vamos, estenda as mãos e receba

As poesias que derramo sem pudor,

Açucaradas de paixão adolescente,

De quem anda pela vida, bêbada

Dessa coisa doce que é o amor.


Deboche

 Haste rígida

Língua bífida

Vida insípida

 

Sem ternura

Sem candura

Habilidade madura

 

Semeou confusão

Mentiu com tesão

Serviu  o pão

Que o diabo

Amassou com o rabo

 

As palavras com fogo cerziu

Bordadas com atentos pecados

Tanto viveu quanto fingiu

 

Repousa pálida e solitária

Uma já sem vida e ordinária

Viúva de beijo debochado

 

Sem saudades ou recado

Apaga sua existência terrena

Com um sorriso vil, na face serena


Fácil sorriso ferido

 O seu sorriso manso construía certezas,

Embalava esperanças doces;

Porque atrás daquele jeito sincero de ser

Havia um mundo de sonhos prontos

Para povoar uma vida inteira e simples.

 

O tempo não passaria sem lhe pedir permissão,

Nada e ninguém ousaria ferir sua paz,

Os dentes alvos e perfilados simetricamente

Combinando com o olhar distante em algum ponto

Espreitavam cada palavra estrategicamente pensada.

 

Nem o medo, nem toda a angústia do mundo

Esvaziava seu abraço sempre forte e sincero;

Tudo ficava menor diante do seu sentir

Que dava colorido especial a cada sensação.

Emoção era sua essência vital, a despeito 

De qualquer detalhe experimentado por quem fosse.

 

Estava expressa na sua presença a amizade,

O amor em todas as suas nuances 

Sem máscaras; puro como só o amor pode ser.

Entretanto, todo frescor daquele sorriso,

A vontade inabalável de viver e

Unicamente se doar sem restrições

Podia morrer e morreu num sopro gelado.

 

Golpe baixo que nunca mais poria de pé

A estrutura frágil daquele cristal 

Que refletido conduziria meus derradeiros passos.

Amarelando inerte em algum retrato 

Ficou sua melhor lembrança, única talvez,

Nada poderia ser mais franco que seu sorriso fácil.


mosaicos poéticos

 enluvei as mãos 

para acariciar as palavras

que soluçavam 

sobre o alvo papel

 

na brancura fria

da mesa de mármore

jaziam esquecidas

palavras solitárias

escorridas de alguma saudade

 

recolhi com úmido cuidado

formei desenhos poéticos

e na fornalha do meu coração

moldei poemas mosaicos.


Hebreu II

 Tu, oh filho de David, que és fonte

De águas vivas, videira de doce néctar,

Sopro de vida nos jardins e no monte,

Arrebatastes meu coração de âmbar.

 

Tu, que és do Líbano cedro altivo,

Alvo como as colunas de puro marfim,

Amo e senhor que te quero cativo,

Não desvias teus olhares de mim,

 

Da tua língua destilas puro mel,

E dos teus lábios de romã partida,

Ampara e edifica meu broquel.

Oh! venturoso hebreu, me convida.

 

Já despi a túnica me banhei em leite,

Nos teus olhares, sou pérola de colar.

Oh !hebreu se apresse e me aceite,

De corolas abertas sou um nenúfar.

 

Amado meu, que pastoreias entre os lírios,

Segue a liteira noturna, rompe as portas de Sião,

Apascenta minh´alma que de delírios,

Anda vagando na imensidão.

 

Te busquei, amado da minha alma,

Rodeando cidades, ruas e praças.

Na recâmara que me  concebeu sem calma,

Entalhei de pedrarias as minhas taças,

 

T´espero amado, com os cabelos orvalhados,

Ondeantes como de Gileade o rebanho,

Nos meus seios que te tenho preparados

Gotejando aromáticas flores do banho

Hebreu


No leito do Jordão não estás,

No pomo do meu corpo ansioso,

Também, oh, hebreu, tu não jaz!

Me abraça o oriente furioso.

 

Nas fráguas dos dias, as lutas,

As conquistas, te afastam do meu leito,

Amado filho de Israel sei, escutas,

O pranto que goteja do meu peito.

 

Banha-te nos sóis e neles te batiza,

De deserto; pois longa é a jornada,

De Horebe a Jerusalém onde divisa,

Com o anjo, a  minha chegada...

 

Oh amado hebreu que t´espero,

Além dos vales e das profecias,

Sob as torres do marfim, me esmero

Banhando-me em leite e especiarias!...

 

Pende ante a lótus que repousa quieta,

Teu olhar viajor, rei da terra prometida,

Vem pois! e a contempla tão seleta

Tua flor babilônica, serenamente adormecida....