Meu diário de bordo

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Outro tempo



Olhando pelo espelho vejo o passado bem nos meus olhos; brilhando, pulsando quase querendo sair. Talvez eu não deva mesmo esquecer por isso ele insiste em me  mostrar  que é pra eu nunca esquecer que fui verdadeiramente feliz.
Sim eu fui criança um dia , eu não nasci desse tamanho, nem velha! Lá vem uma dose nada econômica de nostalgia. Nessa época não havia computador, nem celular, nem tablet e eu sequer tinha televisão em casa, mas como era divertido o meu dia, lembro-me de passagens pitorescas brincando de rodar pneu na rua com meus irmãos, andando de carrinho de rolemãs, de patinete, brincando de queimada, pic esconde, mocinho e bandido etc.
Vale lembrar que nesse tempo a gente podia ter revólver de brinquedo e por mais que parecesse com o do Roy Rogers não dava pra confundir com um de verdade.
Gente quando me lembro que até de rezar missa a gente brincava, penso que se fosse hoje com o policiamento do politicamente correto não nos faltaria uma enxurrada de críticas e castigo.
Quando não estava na rua, estava brincando de boneca que podia até ser de papel! Era divertido a beça; pegava fotos de revista e montava uma casa e ali passava horas entretida.
Desenhava também minhas próprias bonecas e muitas roupinhas para ela trocar, sapatinhos, botas como aquelas que eram vendidas e eu não tinha, mas eu sempre  queria uma variedade de roupas, gorros, bolsas e coisas diferentes por isso criava.
Aprendi a ler e escrever muito cedo porque sempre fui muito curiosa, tinha 4 anos quando ganhei meu primeiro caderno de caligrafia e lembro-me que ficava na beiradinha da máquina de costura da minha mãe, enquanto ela costurava, fazendo exercícios que ela me passava. Nessa mesma época também ganhei meu primeiro caderno de desenho; outra paixão da minha vida; era daqueles cadernos grandes, grossos e com folhas de papel de seda entre as folha, um luxo! Foi Seu João, ele que era pintor e amigo da família quem me deu, não sei se pintava em paredes, mas eu me lembro do caderno, dos desenhos e dele com muito carinho, ele tinha muita paciência ao me ensinar o que certamente me estimulou muito.
Posso citar mil brincadeiras e diversões, e de que adianta se as crianças de hoje nem ligam 
pra isso?
Acho que fui meio moleca porque aprendi a empinar pipa, jogar bolinha de gude, bater bafinho, rodar pião também pudera tenho 3 irmãos  e 2 com quase a mesma idade. Quando olho pra trás eu vejo quanto eu fui feliz, que variedade de coisas tinha pra fazer e o melhor; variedade para criar porque mesmo que não tivesse com que brincar a gente inventava.
             Lembrando Casimiro de Abreu:
             Oh! que saudades que tenho
             Da aurora da minha vida
             Da minha infância querida
             Que os anos não trazem mais.

Fim da linha


Quando digo que estou cansada, não quero dizer  físicamente; estou cansada de uma canseira sem cura; afinal já percorri a estrada toda e já estou fazendo o caminho de volta.
A estrada na ida nos distrai com tantos atrativos e nós ainda estamos vigorosos, cheios de sonhos e expectativas vamos céleres sem que os tropeços e dificuldades nos molestem.
Ah! A caminhada de ida é tão interessante, a gente não sabe exatamente onde vai dar , mesmo quando muitas pessoas tentam nos mostrar, não enxergamos porque o próprio caminho é o que mais importa.
Quando a gente é jovem vale trapacear mesmo que seja com a gente mesmo. Temos sede de novidades, de viver e aproveitar cada segundo, parece que a juventude nunca vai acabar ou no mínimo demorar para acontecer.
Mas cá estou eu fazendo o caminho de volta e com a cabeça meio perdida sem saber como será essa volta.
Um dia a gente se levanta da cama e percebe que vai fazer uma viagem e que não vai precisar de mala , que só levaremos o que está dentro da gente; que tudo que acumulou, comprou não pode levar. E é impressionante como juntamos coisas, livros e tralhas de todas as espécies físicas e emocionais. Mas na hora que você nota que está no caminho de volta nada disso tem mais importância. 
Todos tem que fazer o caminho de volta, uns mais cedo, outros mais tarde e há ainda os que voltam sem querer e aliás voltar é a única certeza que temos nessa vida. 
Portanto, já que estou com o pé na estrada vou voltar com classe, aproveitar a paisagem, tomar cuidado com as intempéries, tropeços e assim percorrer com mais tranquilidade a kilometragem que resta.

sem nexo


Carrego mais de meio século de angústias que nesse exato momento se chocam com a imperfeição da minha paciência. Aquela usina que recarrega as minhas energias, a mesma que me faz ser tão urgente, já não abastece com a mesma presteza a minha já tão escassa inspiração.
Sinto o engasgo das palavras que não escrevo, o sufoco abafado no peito que dói sem remédio e a mão abobada segue inerte diante do papel alvo.
Passo dias com a cabeça borbulhando pensamentos, alinhavando idéias que morrem sem alcançar a droga do teclado. Na rua rabisco flashs em retalhos rotos que acabam espalhados pelas bolsas sem qualquer significado.
Minha cabeça lateja, o peito vai somando dias e dias de tortura nesse casulo infame; represada e aprisionada em mim e por mim.
Sou nesse instante um amontoado sem graça de vocábulos adormecidos, uma porção de verbos mudos.
Quanto mais me procuro mais me exilo de mim. Quanto mais eu me embrenho nessa escuridão mais eu me afasto dos meus passos.
Não existe praticidade na vida de um poeta, não existe caminho curto.
Quando as angústias não explodem das veias pra nascerem poemas ou prosas... Morre um poeta e agoniza um ser humano...