Meu diário de bordo

quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Mil vezes em mim


As vezes eu quero ficar, as vezes eu quero sumir, tem dias que estou com vontade de rir e outros de morrer.
Quase sempre que quero ficar só e trancada no meu silêncio, mil coisas solicitam a minha atenção, e quando estou me sentindo absolutamente só e querendo alguém pra conversar, as pessoas estão todas ocupadas com as suas próprias dores, tarefas e até com a sua própria solidão.
Ando em volta de mim mesma sentindo calor e frio, irritada com os barulhos, buzinas e com as pessoas que agridem meus silêncios ou interrompem meus pensamentos. Parece  que tenho agulhas nos olhos, facas na garganta, sensações de dor e uma saudade de nem sei o quê.
Olho para o céu e quero subir, me acho um bicho castrado sem as asas, olho pra rua e quero ir em frente sem vontade de olhar pra trás, mas sinto os pés agarrados ao chão como se estivesse presa por raízes profundas. Algumas vezes sou um anjo, outras sou rainha no meu bordéu, diaba do inferno que arde dentro de mim.
Eu rio, rio um riso bobo, rio de mim e pra mim, esperando com esse riso mentir pra quem eu não sei, que a vida corre nos trilhos e que basta passar a mão num violão que a noite se cobre com um manto de estrelas. Eu rio e choro de mim e pra mim sempre que me olho e não me acho, pois nunca sei quem sou ou onde deveria estar se nesse chão que se racha sob meus pés continuo entalada qual hera mal plantada, secando sem encontrar muros para fugir.
Há dias que quero morrer e no seguinte renascer como fenix de cara nova, e há dias que simplesmente não queria ver nascer para não saber se quero viver ou simplesmente nele me perder entre as horas sem ter compromissos de ser.
Que desatino viver sem ter certeza se quem olho no espelho sou eu, que indelicadeza não ter nos olhos, na pele e na mãos a alma que volita acima dessa roupagem densa que morre um pouquinho a cada dia. 
Ah como me quero imortal, hoje, agora, navegando nesse mar de ilusões e sentimentos, sem porto para atracar, sem praias a me esperar, como me quero eterna nos meus olhos que se enchem de pérolas brilhantes, rolando...como me quero dona dos mistérios que hei de herdar para transformar o que for da minha vontade quando um dia tocar.
Não desejo a eternidade no viver, porque hoje eu só quero morrer, mas almejo renascer de mim todos os dias enquanto puder viver para me experimentar indefinidamente...


Varal de sorrisos


Há muito deixei sorrisos secando nas janelas por onde passei, nem sei ao certo se de volta recebi algum aceno ou se em alguma curva deixei de ouvir versos adocicados ou discursos desaforados.
Não sei se ensaiei os gestos nos esquadros das palavras não me lembro mais dos improvisos que amontoei sem cuidado.
Tudo que sei é que ando na mesma trilha de sempre, a mochila é a mesma e os farrapos que me cobrem ainda tem um resto de perfume.
Já percorri vales e agremiações da mesma forma que falei nos púlpitos e porões,  e sou a mesma caricatura que sempre fui para mostrar o riso frouxo que mora no meu espírito eternamente criança. Se engana quem pensa que hei de envelhecer, jamais!  Rasgo calendários e mesmo me assumindo encarquilhada defronte a qualquer espelho deixo escapar o aroma suave das manhãs de preguiça que se contrastam em mim, com a assinatura firme de segunda a segunda.
Alguém um dia recolheu na varanda do tempo, meus dentes ainda alvos cheirando a dentifrício de menta e se encantou com o oval do meu sorriso descompromissado; seria essa a minha grande marca se não expusesse meu olhos amendoados no olho mágico de onde tudo se pode ver. Mas quem sabe se a mesma íris que reteve a gargalhada entre lágrimas conhece-se de frente?
Parece lúdico passear por entre as horas todo o  tempo fazendo caretas, mas é insano amarrar os lábios orvalhados, nublar os olhos brilhantes para levar nas costas embrulhados até que sobrem espaços suficientemente lúcidos para reconhecê-los.
Assim se voltar as páginas e tiver que repaginar alguma coisa, certamente não serão os sorrisos, talvez sejam esses os únicos e verdadeiros afetos que deixei.

Solidão a dois; de dia sinto frio, de noite penso em suicídio.

A poeira no entalhe dos móveis fazia ranger de solidão as portas da alma, nela perdiam-se  horas inteiras de silêncio. Doía sentir sua acomodação, seu desenho intacto resguardado numa espera sem fim.
Nem o tique-taque contínuo do carrilhão da sala balançava a esperança antiga e adormecida, tudo jazia sem vida naquele dia que nunca terminou.
Olhei ao redor e nada se movia, olhei para dentro de mim e um reboliço de desejos não se calava. Ao sabor dos meus cadenciados passos bebi a solidão que se derramava em mim; foram anos de brindes sinceros de mim para comigo, foram dias e mais dias de porre ...
Ali estava eu olhando para as marcas que se perpetravam no ambiente, sem entender como foram se acomodando silentes, mesmo quando a vida pululava nas horas.
Fui a minha mais fiel companhia nos últimos anos; sorri e gargalhei para o meu reflexo, chorei muitas vezes no meu ombro afagada pelas minhas mãos, xinguei e briguei pela minha teimosia,  fiquei de mal comigo inúmeras vezes e por dias sem fim nem me olhei de tanta mágoa, e agora nem um murmúrio sequer denotava minha presença.
Parada diante da eternidade olho e não me encontro, talvez minha voz tenha se calado no eco sem resposta ou meu eu assumido meu alter ego para se mudar além de mim, somente assim a vida pode se manter jorrando nas minhas veias.
É hora de fechar algumas portas para não ouvir rangidos e abrir todas as janelas que apontam para o infinito, a vida continua lá em algum lugar.

quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Serenata em versos




Que eu sinta na pele cada melodia,
Vinda da flauta doce do seu desejo.
Que não morra nos poros o ensejo
De fazer-lhe versos vestidos de poesia.

Sonetos decassilábicos, tântricos
Que nasçam de palavras sonoras,
Como nos sonhos das nossas auroras;
Poemas para poetas e românticos.

Poemas sussurrados como carícias,
Paixão explodindo em doces afetos,
Cantarolado em múltiplos dialetos.

Que meus poemas sejam declarações;
Encharcados como eu de emoções,
Para cada estrela solitária na terra.

domingo, 1 de setembro de 2019

Um réquiem para o silêncio


       A multidão de palavras ansiosas e barulhentas que me seguiam cegamente, sem mais nem menos calaram-se, ficaram apáticas...
      Eu as vejo, eu as sinto, mas elas emudeceram inexoravelmente; perderam o vigor, o brilho; parecem flores murchas num vaso sem graça.
     Arrasto por onde ando um silencioso cortejo de verbetes apagados, como se lhes tivessem roubado a alma. Sombras patéticas hoje...as mesmas que percorriam minhas veias, faziam meu coração saltitar quase boca afora.
     Acordo e me deito sentindo um vazio dentro do peito. Tenho a garganta entalada de silêncios. 
     Sou qual um grande quebra-cabeças revirado, faltando pedaços vitais.
     Nem céu, nem mar, nem anjos ou gentes conseguem tirar as minhas palavras dessa patética agonia em que permanecem, irritantemente.
     Não há calor suficientemente capaz de aquecer minhas poucas emoções e não há sentimentos que potencializem as emoções das minhas rotas palavras a fim de tirá-las dessa caprichosa de mudez. 
    Não há risos que sacudam o mofo dessa estagnação contínua. 
    Não, não há estusiasmo que desperte a fúria dos meus dedos em martelar de novo essas tristes palavras, que insistem em definhar num canto qualquer de mim.
     Lá no fundo da minh'alma permanece um frio tumular ameaçando ruir sentimentos pela rigidez advinda das palavras engessadas, tristes e amofinadas.
    Caminho a passos lentos, coração gelado, arrastando essa pequena multidão de palavras mortas, como se sina fosse carregar palavras fantasmas que não falam mais, mas não se desgarram da minhas entranhas...


O céu da eternidade

          Persigo o céu das palavras, onde não há limites para fantasia e o sonho nunca finde.
          Onde será o sétimo céu dos sentidos, onde jamais a noite se faz densa, e os dias são simplesmente azuis.
         Quero me perder onde o dia começa, banhando-me no doce das palavras que brotam das cachoeiras, nas curvas dos rios sem fim. Lá onde a vida é uma eterna magia terei jardins suspensos e flocos de algodão para recostar.
        Busco a eternidade das palavras num mundo em que não habito, nos céus de outra era, onde até o efêmero se perpetue pela beleza, como um relâmpago estampado em aquarelas brilhantes.
        Adormeço na esperança de encontrar um mundo feito céus estrelados, sol e lua caprichosamente pintados, onde a vida nunca envelhece.
        Onde encontrar o céu das tantas palavras que me fogem dos dedos? Onde encontrar a poção mágica das palavras pela bebê-las e brindar com poesias e prosas tantos sentimentos?
        Acalento no peito o desejo do "eterno enquanto dure" nem que seja por uma noite e nada mais...