Meu diário de bordo

sábado, 28 de fevereiro de 2009







Maturando o corpo da palavra
Angélica T. Almstadter
28-02-2009

Há dias que mastigo o tempo
lavo-me nas águas do choro;
mais um dia sem poesia
engolindo vozes em conchas.

Flerto com alma do vizinho
gasto as palavras que calo
no pensamento enfileirado
...ainda sem colocar no papel.

Escorre o tempo junto a chuva
que cai no mesmo ralo;
apago as emoções,
e no vazio que me enche o espírito
deixo que dancem palavras;
quiçá um dia nasça
uma poesia com corpo e alma.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

da série Bom Dia

Angélica T. Almstadter

Algum dia em algum lugar meus olhos
hão de sorrir de verdade...
Não deixo rastros por onde ando, não deixo
marcas nas paredes recém caiadas...
porque sou transparente, não tenho pontas
a arranhar os espelhos que me refletem...
Sou apenas uma brisa de pouco perfume...
que roça breve e passa sem deixar saudade...
Tenho no ventre as dores do parto... constantes...
tenho nos braços a herança que não cresceu...
o sonho que não amadureceu...
Tenho o corpo crivado de angústias...
de esperanças adormecidas...
tenho a boca seca de saudades...
e os olhos perdidos em algum horizonte...
Sou um livro de páginas amareladas...
rabiscadas e arrancadas brutalmente...
sou o peso da liberdade e a lembrança da saudade...
Tenho o corpo vazio... o coração sempre apertado
e a boca sangrando através das minhas mãos...
tenho a alma na ponta dos dedos e dela
deixo um pouco toda vez que me faço canção...
Falta-me o ar... falta-me a vida... falta-me a razão principal
de ser e estar em qualquer lugar... falta-me o prazer de ser...
a alegria de viver... falta-me a vontade de prosseguir...
Tenho os pés doloridos... a alma lanhada... tenho as asas cortadas
e os olhos em mar... o que faz de mim um corpo estranho
em mente inquieta...
Faço-me lua para anoitecer... faço-me cânticos para sobreviver...
e nem os raios de sol que me rasgam o olhar...
e cintilam como lâminas podem apagar as lágrimas
que ora escorrem sem rumo...
Em algum lugar há de amanhecer
um dia que tenha sorrisos na janela...
abraços fartos para me envolver...
e mãos a me tocar sem receios...